sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

6x04 "The Substitute"

E parece que a sexta e última temporada de Lost finalmente foi agraciada com um episódio de mitologia, e não é nenhuma surpresa pra mim que eu o considere o melhor dos 4. Longe de mim virar um desses telespectadores que valorizam mais os mistérios do que os personagens (até porque, isso é caminho certeiro para a decepção, já que muitos dos mistérios da série são puro jogo de espelhos e fumaça e poucos vão ter respostas definitivas), mas 3 episódios com tão pouco dedicado ao núcleo da estátua estavam me deixando infeliz. Além disso, "The Substitute" foi magistralmente montado para satisfazer tanto a sede por mitologia, na linha temporal de 2007, quanto a sede de atuações e cenas de construção de personagem, na linha temporal de 2004. De fato, foi um episódio tão intenso que eu tinha certeza que tinha acabado no penúltimo bloco, e já estava plenamente satisfeito naquele ponto. Quisera que todo o resto da série fosse escrita nesse ritmo, certeza que a temporada valeria por duas.

Antes de mais nada, deixem-me frisar que essa última temporada é toda do Terry O'Quinn. Ele é tão competente no que faz que até fisicamente diferentes são as duas personagens que ele interpreta, e sem qualquer tipo de maquiagem ou adereço. E digo mais, ambos totalmente díspares do Locke da ilha. O Locke de 2004 é uma pessoa bem mais plácida e madura do que sua contraparte que caiu com o vôo 815, e mesmo antes de vermos Helen em cena, a atuação de Terry já havia comunicado claramente essa diferença. Por outro lado, o monstro no corpo de Locke é assustador, ainda mais assustador do que o Locke da primeira temporada. Ele tem os olhos frios, calculistas, e com um rancor que genuinamente parece ter sido curtido por centenas de anos. E ainda assim, quando o misterioso menino loiro surge para confrontá-lo com a crueldade dos seus atos, ele responde com um já familiar "Não me diga o que não posso fazer" que, apesar de remeter ao dono do corpo que ele agora veste, tem sua base em um ódio infinito, não em uma frustração humana.

Outro destaque desse episódio foi a direção de Tucker Gates, diretor da tchurma do JJ que foi trazido de volta lááá da primeira temporada (quando dirigiu os excelentes "Confidence Man," "... In Translation" e "Born to Run" e desde então só havia voltado à série para dirigir o chatíssimo "I Do" na terceira temporada). Por mais que eu goste do Jack Bender, e eu gosto muito, é sempre bom quando algum diretor convidado injeta planos e tomadas mais ousados na série. Aquele vôo em primeira pessoa do Monstro de Fumaça pela ilha, por exemplo, é ao mesmo tempo assustador e empolgante. Discretamente dá ao telespectador um vislumbre do poder e da força do monstro, e da fúria com que ele vasculha a ilha atrás de seus alvos. Outra cena em que a direção se destaca é a cena em que Locke faz a entrevista de emprego, com planos desconfortáveis que me lembraram Kubrick.

Nesse episódio também pela primeira vez eu estava igualmente interessado nas duas realidades. De fato, no 2004 alternativo, uma das coisas que mais me chama a atenção é como todas as "reapresentações" entre personagens são boas. A cena entre Hurley e Locke foi ótima, dava pra ver claramente que os dois atores estavam se divertindo genuinamente. E como negar que Jorge Garcia também conseguiu fazer um Hurley confiante e patronizador bastante convincente? Para quem entrou na série fazendo papel de si mesmo, é um crescimento digno de nota.

E só pra chover no molhado mais um pouco, mesmo sem ter tido um grande momento na temporada até agora, Michael Emerson engole a cena do enterro do Locke de tal forma que até a piada do Lapidus soa totalmente fora de tom depois de suas palavras finais. Tenho certeza que no papel ela se encaixava bem, ninguém deveria imaginar que Emerson iria conseguir fazer o público chorar com uma fala de 15 segundos e um olhar tão carregado de emoções conflitantes quanto o sorriso da Mona Lisa.

Em termos de roteiro, "The Substitute" é primoroso. Na linha de tempo de 2004, é um dos melhores episódios Locke-centricos de toda a série, e a resignação com sua condição no final, e a aceitação da Helen, me marejou os olhos. E na linha de tempo de 2007, é um meta-episódio que tem a principal função de resgatar, pela quinta vez, o interesse do público na história depois de um hiato de meses (que é a razão pela qual existem pouquíssimas teleséries com arcos que ultrapassam os limites de uma temporada, coisa que Carlton Cuse e Damon Lindelof aprenderam a duras penas). Enquanto o público é (muito bem) representado por um Sawyer que já não tem mais paciência para a forma manjada da série apresentar seus mistérios - me senti libertado quando o Smokey diz que ele parece "pouco impressionado por falar com um morto" e ele diz que já tá cagando e andando pra essas coisas pseudochocantes -, o Flockezilla tem a função de nos ludibriar (ok, praticamente implorar) para voltarmos a querer saber afinal qual é a razão daquilo tudo. E no fim, depois de tentar nos seduzir com aparições, frases interrompidas, cenas de ação e jogos mentais olhando em nossos olhos, ainda nos dão um doce mostrando aqueles nomes riscados na pedra. E eu que tinha reclamado que não havia mais nada na ilha para ser descoberto, tive uma grata surpresa que chegou a remeter ao famoso e saudoso mapa na parede da escotilha (guardadas as proporções, claro). Por um momento, Lost voltou a ser aquela série que uns dementes (eu) ficavam dando pause e capturando tela pra analisar centímetro a centímetro cada pedaço de cena. E eu fui feliz.

Então ok, Damon, Cuse, vocês me convenceram a mais uma vez me envolver com a história de vocês. Não tenho grandes expectativas, mas as poucas que eu tenho, espero que vocês não decepcionem ao final. Por enquano, tá indo tudo muito bem.

E antes de ir, só para eleger como melhor cena do episódio aquela em que o Locke falso pega a pedra branca, analisa lentamente, depois a atira no mar e quando indagado por Sawyer o que foi aquilo, responde: "piada interna" =D

Semana que vem tem mais!

2 comentários:

  1. Gostei bastante do jeito que você botou o Sawyer como nós, o publico; e o MIB como os produtores.

    Uma ótima crítica prum ótimo episódio. =)

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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