Lost é uma série misteriosa. Não apenas em seu enredo, mas também em sua capacidade de me cativar ou não. Antes do início da sexta e última temporada, o ponto aonde o quinto season finale havia nos deixado, aliado à decisão dos produtores de não revelarem absolutamente nada sobre o futuro da série até bem pouco antes da reestréia, criou em mim aquele efeito já conhecido dos fãs do primeiro Matrix - fiquei internamente teorizando sem qualquer material para me embasar, e consequentemente sem nada para me limitar. Além disso, a pesada autoreferência contida nas promos que usavam apenas cenas das temporadas anteriores me deixou pronto e ansioso para uma temporada que tivesse um climão amalgamado dos melhores momentos da primeira, segunda e quarta temporadas (as que têm as melhores atmosferas, na minha opinião). Daquela época em qua ainda não sabíamos de nada e cada novo episódio dava mais nós na nossa cabeça. Sim, eu sei que a maioria de vocês que reclamavam da falta de respostas naquela época hoje também se sentem órfãos da sensação, não precisam esconder. Aqueles eram os dias.
Pois bem. Quis o destino que o último season premiere duplo, "LA X," não me empolgasse o suficiente para me fazer escrever sobre. E no entanto, o terceiro episódio, "What Kate Does," que muita gente criticou por ser arrastado e sem ritmo, estranhamente me empolgou tanto que resolvi fazer uma crítica conjunta às 3 primeiras partes do fim da saga Lost. Então perdoem-me pelo tamanho do texto, pensem que são 3 episódios sendo analisados.
Nesses meses que separaram "The Incident" de "LA X," a questão primordial na cabeça dos fãs (ok, na minha) era saber se as previsões do saudoso Daniel Faraday estavam corretas e se a bomba realmente faria um reset na série. "LA X" já começou me fazendo "a-há" e revelando que os produtores mais uma vez tinham me feito de bobo. A bomba tanto funcionou quanto não funcionou, e agora eu estava vendo os dois resultados em paralelo. Tá, ok, Darlton, vocês me pegaram de novo. Claro que se alguém tivesse teorizado que "ei, a explosão funcionou mas não funcionou" antes da estréia, teria sido descartado imediatamente como absurdo. Mas essa decisão ousada, apesar de surpreendente, não deixa de ter consequências. Qual das realidades eu deveria estar seguindo? Qual a relevância de uma pra outra? Uma realidade aonde o vôo 815 nunca caiu é poética e cheia de significados, mas o que há pra se ver além do aeroporto? Uma das coisas que me incomodou na season premiere foi isso. Ao que parece, a realidade desses "Flash Sideways" tem lá suas coincidências e similaridades com a linha de tempo que acompanhamos por 5 anos, mas só essas pequenas estranhezas não foram suficientes para me deixar realmente interessado no desenrolar da trama naquela realidade. Nem as aparições de Boone, Charlie, Arzt, Neil e outros ex-cadáveres me fizeram nada, primeiro por (fourth wall, eu sei) saber que Ian Sommerhalder e Dominic Monaghan estão comprometidos com outras séries e portanto dificilmente vão aparecer de novo, segundo porque evidentemente senti falta de outros ex-sobreviventes (Shannon, Ana Lucia, Libby, Michael, Walt, Eko, até do Paulo e da Niki). Mesmo que aparecessem de relance, acho que teria sido a melhor season premiere do universo se eles tivessem de fato recomposto todo o vôo 815 e não apenas salpicado uma ou outra participação especial aqui e ali.
Por outro lado, na realidade "principal" (ou seja, a que continua a saga de onde ela parou), o que me incomodou um pouco foi que - a despeito do que o clima das promos me fez acreditar - não existem mais mistérios. O Templo, o último dos misteriosos locais da Ilha que ainda residia apenas no imaginário do público, foi revelado em grandes planos abertos logo no primeiro episódio. Isso me deixou um pouco melancólico - talvez por ter deixado crescer em mim um saudosismo da primeira temporada, graças às promos. Agora, a não ser que inventem alguma estação Dharma maluca no meio da temporada (duvido), já conhecemos a Ilha inteira. Não entendam mal, eu estou tão ansioso para ver o desfecho da batalha entre Esaú-Flockezilla e Jacob quanto qualquer um de vocês. Mas definitivamente, a temporada não terá nada de parecido com a primeira. E nem deveria ter, se pararmos para pensar. É o desfecho da história. Os movimentos finais do jogo. A hora de grandes e épicos confrontos, não de mistérios e sutilezas.
Passando por cima dessa sensação esvaziada que "LA X" me trouxe, tenho que ressaltar que a premiere tem seus grandes momentos. Em especial, o Adversário falando sobre Locke e a sua morte, foi bastante tocante, principalmente quando víamos alternadamente cenas do bom e velho (e paralítico) Locke na realidade alternativa, ostentando um orgulho quase sincero por ter feito o Walkabout. Todo mundo sabe que eu adoro Terry O'Quinn, mas a atuação dele em dois papéis nessa premiere estava arrasadora. Inclusive, é preciso dizer que Terry fazendo um vilão é algo tão delicioso que eu quase sinto raiva dos produtores por terem guardado esse papel para a reta final.
Outro que voltou com tudo em termos de atuação é Josh Holloway, a meu ver o ator que mais cresceu ao longo da série. Aliás, intercalar cenas dos personagens ainda no distante 2004 pré-queda com 2007 pós-merda-toda realmente faz sobressair a evolução de certos personagens (Sawyer, Locke) em contraste à mesmice de outros (Jack, Kate). Não acho que seja tudo culpa dos roteiristas, o trabalho de Josh e Terry tem grande participação nesse aspecto.
Nem preciso dizer que as interações dentro do avião e no aeroporto foram muito bem conduzidas e, por vezes, me trouxeram lágrimas aos olhos. A autoreferência em Lost é certeira, e a série nunca vira uma paródia de si mesma (bem, à exceção da terceira temporada, mas graças a deus isso são águas passadas). E Michael Giacchino sabe que seu trabalho com esses personagens e cenários está chegando ao fim, então não guarda áses na manga. Toda a trilha sonora de "LA X" é apoteótica em seu leitmotif.
Agora deixando a premiere de lado e finalmente chegando a "What Kate Does;" Talvez tenha sido a ausência da expectativa criada para a reestréia, mas o terceiro episódio remediou o que havia me incomodado a semana inteira: despertou um interesse sincero pela realidade paralela de 2004. Rombos de roteiro à parte (em que universo uma adolescente grávida recém-chegada num país estranho aceitaria uma carona oferecida pela mesma pessoa que sequestrou seu taxi horas antes botando uma arma em sua cara?), as similaridades bizarras entre as interações dos personagens em uma e outra realidade deixam de ser apenas um fanservice e passam a realmente encafifar o público. A hora em que Ethan aparece me deu um arrepio. E toda a história dele retardar o nascimento de Aaron com drogas ("Não quero espetar você com uma seringa sem seu consentimento." - O RLY Ethan?!) e o fato de Kate estar perto de Claire na hora do parto, enfim, eu realmente agora acho que tem algo de curioso ocorrendo com aquelas pessoas e quero saber o que é. Ainda não estou totalmente comprado, me falta um sinal de que aquilo tudo é ou será relevante para os Losties da realidade principal (só o "funcionou" de Juliet não me convenceu). Mas estou entretido, pelo menos.
E na ilha de 2007, apesar de não termos tido Flockezilla, tivemos mais cenas ótimas com Josh Holloway, e um pouco de mitologia. Aparentemente, o monstro de fumaça tem meios de reviver e corromper os corpos dos recém-falecidos da ilha, além de simplesmente tomar a forma deles. Se os Others são o exército de Jacob, montado através dos tempos com pessoas que eram atraídas para a ilha, o Monstro também reforça suas fileiras infectando os mortos. Ficou evidente, agora, que Claire morreu na explosão da casa em Otherville e que foi ressuscitada pelo Monstro, e lentamente corrompida até ser levada embora pela imagem de Christian. E Sayid, parece, terá o mesmo destino. Tenso!
Por outro lado, Jacob não é nada idiota, e sabia exatamente a equipe que estava montando quando reuiniu os Losties que precisava para reverter sua morte, fato evidenciado quando ele aparece para Hurley, que é "aberto" para a visita de espíritos. Porém, seu plano não está funcionando a contento, já que ele disse que Sayid tinha que sobreviver a qualquer custo, o que não ocorreu. Será que Jacob se lascou? Ou isso é só mais um movimento de peças por parte dele?
Quanto ao Dogan e sua turma, estou tentando superar o desconforto que sempre me acomete quando um personagem importante surge do nada no meio da história (se o Dogan é o manda-chuva dos Others do Templo, qual a relação hierárquica dele com Richard, ou mesmo com Ben? Ele não devia ter sido ao menos mencionado antes?). Mas fora isso, ganhei uma certa simpatia por ele na cena em que ele faz Jack desengolir a pílula de veneno. Só espero que ele comece a falar logo, porque nem eu tenho mais paciência para o discurso otheriano de falar pouco e dizer nada.
No final das contas, a sexta temporada de Lost pode não ter me pego pelas bolas logo de início, mas me capturou a contento. Não tenho reclamações a fazer do ritmo ou da forma como esse último ato se desacortina, mas espero que não demorem muito a amarrar as duas histórias que estamos assistindo. Ficarei mortalmente decepcionado se descobrir que a realidade alternativa de 2004, onde o avião não caiu, não faz qualquer diferença para a disputa milenar de poder entre as peças brancas e as peças negras, que se aproxima de um desfecho em 2007.
Agora é roer unhas por mais uma semana ;)
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